Lar Marcos Rogério Já perdeu alguém próximo? Uma mãe, um amigo, um pai, um irmão?
Marcos Rogério

Já perdeu alguém próximo? Uma mãe, um amigo, um pai, um irmão?

É complicado, triste e inesperado. Lembro da vez que perdi meu sogro, uma pessoa incrível. Foi logo no início do meu casamento, e foi um momento extremamente difícil. Também perdi um tio quando ainda era adolescente, o Agamenon, uma pessoa incrível. Já falei dele no meu primeiro livro.

Perder. Não ver mais. Não conversar. Tenho as últimas mensagens da minha amiga locutora Iêda Fagundes no meu WhatsApp. Ela estava internada, e me despedi dela pelo celular. Também tenho salvas minhas últimas conversas com meu irmão Marcone. Quem conheceu esse cara, quem foi amigo dele, sabe que ele era incrível. Tocava violão, era craque no futebol, pescador, enfim, uma pessoa fantástica! Ele foi uma referência na computação em Vespasiano. Um verdadeiro desbravador de códigos e programas.

Ele se foi. Em uma bela manhã, indo trabalhar, se foi um pedaço da história da minha família e da minha cidade.

Lembro como fiquei sabendo. Estava viajando, na praia, quando as mensagens começaram a chegar. De madrugada, na cozinha do apartamento com vista para o mar, ouvia Eagles e Porcupine Tree, quando meu celular tocou. Era Celinho e meu amigo Aurélio, ambos chorando e homenageando Marcone. Passamos a noite conversando sobre ele, bebendo e lembrando.

Visitei seu túmulo quando voltei da viagem. Agora, vou contar como saí do cemitério.

Afredo estava na cidade, vindo de São Paulo. Marcamos de nos encontrar num bar que fica na rua do cemitério velho. Alfredo adorava meu irmão, passamos muitas noites juntos, tocando viola e rindo. Ele sabia que eu não estava bem. Passei perto da FASEH ouvindo Renato Russo no som. Viro mais uma rua e vejo o bar cheio, provavelmente uma festa particular. Uma pena, pois escolhi esse lugar para continuar minhas homenagens ao meu irmão. Sigo pela avenida, em direção ao Zé Rocha, onde Betinho costuma ficar. Está fechado. Subo a Thales Chagas, com Alfredo ligando. Digo para ele esperar, pois mudei os planos. Vou avisar quando chegar. Sigo pela Thales Chagas e encontro um bar. Vejo um casal numa mesa, cumprimento-os, entro e vejo o dono no balcão. Peço uma cerveja e percebo um violão encostado. Também tem um pequeno palco e um cajon.

– Que legal, tem música ao vivo aqui? – pergunto.
– Pois é, eu tenho esses instrumentos aqui, sempre aparece alguém e toca. É muito bom – responde o dono.
– Meu irmão adoraria esse bar – comento.

O dono deixa o copo que está lavando na pilha, vem para perto do balcão e olha para mim.

– Eu conheci o seu irmão – diz ele.

Gosto de conversar olhando nos olhos das pessoas, sempre foi assim. “Eu conheci o seu irmão” saiu tão sincero que até pedi uma cachaça gelada, precisava me preparar para o que viria a seguir.

– Conheceu? – pergunto.
– Sim, Marcone era seu irmão, né? – confirma o dono.
– Sim.
– Marcone não saía daqui, Marcos Rogério. Eu e seu irmão éramos grandes amigos.

Passei um bom tempo ouvindo histórias sobre Marcone. O dono do bar, Tonim, o conhecia muito bem, e eu agradeci pelo momento. Saí de um cemitério triste e, de repente, me vi em um bar onde meu irmão gostava de frequentar. Pedi mais uma cerveja, Alfredo chegou. Pegamos o violão e fomos para a mesa lá fora, tocamos muito. Na primeira pausa, um senhor sentou-se na nossa mesa e pediu para tocar também. Tranquilo.

Comecei a ouvir uma bela voz saindo daquele até então estranho para mim. Mais um brinde para Marcone, mais um gole de cerveja. Bebi, fechei os olhos e parecia que Vander Lee estava tocando perto de mim. Não, era o estranho, seu nome, Tiãozinho. Mais um presente para este dia difícil. Tocamos mais, cantamos, Juninho chegou e pegou o cajon do bar. Cada música era uma homenagem para o meu saudoso irmão. Paguei a conta, não queria ir embora, faltava algo. Fui para a casa de Raposão e Márcia.

Eu não sabia, mas era necessário.

Entre copos, cervejas e uma bela música tocando, a conversa fluiu e me colocou com os pés no chão. A morte faz parte de nós, é inevitável, e todos nós vamos passar por isso. Muita gente já sofreu demais com esse destino. Muita gente.

– Marcos, eu sei da sua dor. O remédio é seguir em frente e saber que a morte é inevitável. Quando perdi meus pais eu ainda era muito jovem… Sofri demais, mas segui, temos que seguir…disse Márcia.

A lição foi dita e aprendida. Foram horas de conversas e de ensinamentos através das experiências de vida desse casal. Aprendi muito, me emocionei muito. A cumplicidade mútua deles era incrível de assistir, de conviver e de aprender. Mais um presente que agradeci de coração.
Fui embora pensativo, o carro devagar, subindo a estrada velha de Lagoa Santa, ouvindo Gênesis com Phil Collins na bateria.

Num dos dias mais tristes da minha vida, conheci um bar que tinha um palco, cajon e violão para os artistas da terra, um amigo cantor, um grande artista que mora entre nós, e um casal fantástico que brinca com os desafios da vida e faz disto uma lição para todos nós.

Esse dia foi um presente de Marcone, com certeza.

 

Marcos Rogério é radialista, baixista e produtor cultural na cidade de Vespasiano.
Diretor do Portal Xpromoções.com, CANAL X no Youtube e da Rádio e WebRádio NOVA

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